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Coluna JC: O que celebrar no dia das mulheres?

Rodrigo Tavares Mendonça

Psicólogo e especialista em psicoterapia de família e casal


No dia 8 de março celebramos o Dia Internacional da Mulher, feriado oficializado pela
Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975. É comum celebrarmos o dia das mulheres
exaltando características específicas delas, ou seja, o que as difere dos homens. Exalta-se,
assim, a mulher como o ser que cuida, que ama incondicionalmente, que tem uma
sensibilidade especial, que simboliza a beleza, que gera a vida, entre outras coisas. Contudo,
será que essas características são realmente específicas das mulheres? E será adequado
buscarmos definir as características específicas das mulheres?

Conta-se que a primeira proposta pública para a criação do dia da mulher aconteceu em
Copenhague, Dinamarca, em 1910, pela ativista alemã Clara Zetkin, no II Congresso
Internacional de Mulheres Socialistas. Essa proposta tinha o objetivo principal de defender os
direitos iguais entre homens e mulheres na esfera trabalhista. Entretanto, não foi
imediatamente aceita pela comunidade internacional, embora tenha se tornado uma referência
para a luta das mulheres. A proposta entrou no debate público durante as incontáveis greves
em vários países do mundo pela defesa dos direitos das mulheres, especialmente nas esferas
trabalhista e eleitoral.

No dia 8 de março de 1917, na Rússia, trabalhadoras do setor de tecelagem entraram em
greve e ainda estimularam os operários do setor de metalurgia a fazerem o mesmo. Foi um
marco para a luta das mulheres. Essa greve teve como referência o incêndio em uma indústria
têxtil que aconteceu no dia 25 de março de 1911, em Nova Iorque, Estados Unidos, que
matou 125 mulheres e 21 homens. O incêndio foi causado por negligência dos proprietários
com a manutenção das instalações elétricas da fábrica. Esse descuido, que revela uma
desvalorização dos trabalhadores e, especialmente, das trabalhadoras, serviu de motivação
para a luta das mulheres pelo mundo.

Após a Segunda Guerra Mundial, com a criação da ONU para organizar diplomaticamente os
diferentes interesses dos países e assim manter a paz mundial, foi estabelecido, tendo como
referência os dois acontecimentos de março citados anteriormente, o dia 8 de março como o
Dia Internacional da Mulher. Como se pode ver, a origem do dia das mulheres não tem nada a
ver com a celebração do que existe de específico nas mulheres, ou seja, não é uma celebração
das características de cuidado, amor, sensibilidade, beleza. O que existe na origem do dia das
mulheres é a luta por igualdade de direitos.

Acredito que exaltar as características específicas das mulheres seja um erro radical, uma
postura que reforça a submissão delas a um ideal socialmente construído. Reforçar a mulher
como o ser que cuida exclui do ideal de boa mulher aquelas que não querem filhos, por
exemplo, ou aquelas que não priorizam o cuidado com a família e a casa, que buscam um
caminho mais solitário ou independente. Reforçar a mulher como o ser que ama
incondicionalmente limita o ideal de boa mulher naquelas que priorizam o amor ao marido e
aos filhos, por exemplo, além de excluir os homens do papel de também amar
incondicionalmente. Reforçar a mulher como o ser que tem uma sensibilidade especial exclui
do ideal de boa mulher aquelas com comportamentos mais objetivos ou agressivos,
normalmente visto nos homens; além de limitar os homens a um ideal também socialmente
construído.

Enfim, definir características específicas das mulheres pode limitar a liberdade delas de
serem o que elas quiserem ser. Complementarmente, o mesmo vale para os homens, pois a
definição de um papel feminino define também um papel masculino. E como todas as
características que definem o ideal de uma boa mulher ou de um bom homem foram
construídas socialmente, ou seja, não estão na biologia da mulher ou do homem, defini-las é
um erro radical; inclusive para os homens, que se limitam em um papel que também os
oprime.

Atualmente, as mulheres continuam em desvantagem de direitos em comparação com os
homens. A pandemia do novo coronavírus escancarou o problema da violência doméstica,
pois os casos aumentaram. Além de sofrerem nas mãos de maridos violentos, as mulheres
sofrem assédio cotidianamente na rua e no trabalho. Elas ainda recebem menos que os
homens e costumam trabalhar cuidando da casa e dos filhos bem mais que seus
companheiros. Ou seja, a luta pela igualdade de direitos ainda se faz necessária.

Então, no dia das mulheres, o que devemos fazer não é parabenizá-las por terem
características ideais construídas socialmente, mas valorizarmos a igualdade de direitos e a
liberdade delas de viverem como elas quiserem. E vale enfatizar: só assim, sem a definição
de características específicas ideais com base na identidade de gênero, os homens também
terão a liberdade de viverem como eles quiserem.

 

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