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Uma proposta empírica de classificação dos governos municipais: do endógeno ao sistêmico.

A classificação dos políticos e, consequentemente dos governos, em “direita” e “esquerda”, é, para mim, uma coisa muito subjetiva. Principalmente no Brasil, onde os partidos são uma massa amorfa, sem ideologia definida, onde quase todo mundo se considera ou se classifica “de esquerda” – é uma profusão enorme de partidos socialistas, socialdemocratas, populares, dos trabalhadores, trabalhistas, e assim por diante. Ao analisarmos o espectro político brasileiro, vemos uma homogeneização ideológica, de pensamento e de ações, na qual não há como distinguir um partido do outro – direita e esquerda; situação e oposição – são apenas versões diferentes de uma mesma coisa. Só muda a embalagem (as logomarcas, o jeito de vestir, o discurso, etc.), a prática e o modo de agir são os mesmos. E, quando olhamos para o município – que é onde as coisas acontecem – vemos que essa classificação fica ainda mais esdrúxula. Por isso, vou sugerir aqui uma classificação dos governos municipais, baseada em parâmetros mais palpáveis do que aqueles (se existem!) usados para determinar se um governo é “de direita” ou “de esquerda”. No meu ponto de vista, os governos municipais poderiam ser classificados em relação à visão que possuem de si mesmos e da sociedade, ou seja, do papel que acham que devem exercer no funcionamento da cidade. Nesta classificação teríamos dois extremos, em um deles ficariam os governos que funcionam em função de si mesmos, e dos grupos e segmentos que o compõem. A estes chamaremos de governos com uma visão endógena de funcionamento, ou simplesmente “endógenos”. No outro extremo estão os governos que veem a cidade como um todo, e, que se vê apenas como uma pequena parte deste todo. A estes governos, que possuem esta visão sistêmica de funcionamento da cidade, chamaremos de “sistêmicos”. É claro que entre estes dois modelos (extremos) existem uma grande variedade do que poderíamos chamar de tipos “mistos”, mas vamos nos ater a descrever os dois extremos, os modelos que estamos chamando de endógeno e sistêmico.

(a) Governos com funcionamento baseado em valores endógenos, ou simplesmente, governos endógenos: são os governos que funcionam para eles mesmos, ou seja, são aqueles que se esquecem de que só existem em função da cidade. A administração é voltada a ela mesma e não ao cidadão. Na organização da prefeitura, existem setores “fins” e setores “meios”. Sendo, setores “fins” aqueles diretamente relacionados à prestação de serviços a população, ou seja, educação, saúde, serviços urbanos (limpeza, manutenção de praças e jardins, etc.), obras, planejamento urbano, dentre outros. E setores “meios” são aqueles que existem apenas para prestar serviço aos setores “fins”, isso é, jurídico, fazenda, contabilidade, administração, setor de pessoal, compras, etc. Neste tipo de governo, o governo endógeno, os setores “meios” se tornam mais importantes que os setores “fins”, isso é, a função da gestão deixa de ser a prestação de serviços à população e passa a ser a atividade burocrática da prefeitura. É uma tendência, neste tipo de governo, que os setores “meios” gerem um volume excessivo de regras e procedimentos burocráticos – apenas para justificar sua existência. Na visão deste governo, o cidadão deve estar a serviço do estado. Os deveres do estado passam a ser atribuídos ao próprio cidadão. Frases que são ditas por esse tipo de governante: “A cidade está suja porque os moradores não contribuem”. “Os moradores é que deveriam adotar das praças”. “Não é obrigação da prefeitura limpar a porta da casa dos outros”.  Este tipo de governo também tem uma visão centralizada de cidade, onde o cidadão deve ir onde o estado está. Os serviços geralmente são concentrados nas regiões centrais. Possuem também uma visão fragmentada da cidade, não conseguem ter uma visão do todo. Geralmente elegem um pequeno segmento da sociedade como “cliente”. Este cliente pode ser o grupo político que elegeu o prefeito, os funcionários públicos, os empresários com bom trânsito na administração, etc. E governam apenas em função deste pequeno segmento.

b) Governos com funcionamento baseado no pensamento sistêmico, ou governos sistêmicos: são aqueles governos que veem a cidade como um todo interligado.  Estes são governos que estão a serviço do cidadão, neles a gestão da “Res publica” – da coisa pública – é considerado como fim último e os setores “fins” são prioritários. O fazer acontecer, o operacional, tem prioridade sobre a atividade burocrática. Para este tipo de governo, o importante é o funcionamento da cidade. Geralmente estes governos tem uma visão descentralizada da cidade, na qual é obrigação do estado ir onde o cidadão está. Possuem uma predisposição ao trabalho em conjunto com outros segmentos da sociedade e valorizam os processos em detrimento das estruturas.

A grande diferença entre estes modelos está na organização do sistema, o governo endógeno é um sistema fragmentado, as partes não conversam entre si. Por isso, neste modelo, o todo é menor que a soma das partes. O governo sistêmico é mais organizado, não fragmentado, por isso o todo é maior que a soma das partes. Explicando melhor: no primeiro caso as ações são desconexas, e por isso é comum o desperdício. Um faz, o outro desmancha. Isso acontece, por exemplo, quando uma rua é pavimentada antes de passar a rede de esgoto. E, por causa disso, o pavimento deverá ser destruído quando a rede de esgoto for construída. No caso dos governos sistêmicos, há maior integração entre seus setores. O que faz com que haja sinergismo entre as ações realizadas, onde elas, as ações, convergem para o mesmo ponto e se complementam. Se analisarmos os últimos governos de Lagoa da Prata, veremos que, a partir do Governo do Prof. Pedro Paulo Resende – cujo governo é um dos primeiros dos quais que me lembro e que considero próximo do extremo “sistêmico” – começamos uma caminhada paulatina em direção ao extremo “endógeno”, e o pior, estamos a cada governo mais próximos deste extremo.

Fabrízio Furtado de Sousa é Engenheiro Agrônomo e Professor.

 

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