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Machosfera: cultura tóxica ameaça igualdade de gênero e segurança feminina

Após caso envolvendo apoiador da “machosfera”, o termo ganhou força nos debates sobre violência e discriminação de gênero.

As mulheres enfrentam diariamente as consequências da cultura tóxica da machosfera, um movimento que prega a superioridade masculina e a aversão às mulheres, gerando desigualdades e dificuldades em diversas áreas da vida. Desde ameaças e agressões verbais na internet até a limitação de oportunidades profissionais, as barreiras enfrentadas pelas mulheres são uma preocupação constante na luta pela igualdade de gênero.

A machosfera é um termo que tem sido cada vez mais debatido nos últimos tempos. Trata-se de um movimento masculinista que reúne homens com o objetivo de propagar discursos de ódio, superioridade e aversão às mulheres. Essa discussão veio à tona após a humorista Livia La Gatto denunciar ameaças recebidas por parte do “coach da Campari”, apelido dado ao influenciador Thiago Schutz.

Na ocasião, o apoiador do “Red Pill”, enviou uma mensagem para a humorista com os seguintes dizeres: “Você tem 24 horas pra retirar seu conteúdo sobre mim. Depois disso, processo ou bala. Você escolhe.”O caso acabou sendo levado à polícia.

O termo “red pill” é frequentemente usado na machosfera para se referir a uma visão de mundo que se opõe ao feminismo e acredita na superioridade masculina. A expressão foi popularizada pelo filme “Matrix”, em que o personagem Morpheus oferece a Neo a escolha entre tomar uma pílula azul e continuar vivendo em um mundo de ilusão, ou tomar a pílula vermelha e conhecer a verdade.

Na machosfera, o “red pill” representa a “verdade” que os homens supostamente descobrem ao se libertar das “mentiras” do feminismo e da suposta opressão das mulheres. Esse discurso, porém, é altamente problemático e pode levar a comportamentos violentos e discriminatórios contra as mulheres.

Em entrevista exclusiva para esta reportagem, a advogada Luciana ressaltou a importância do judiciário e da sociedade como um todo em combater tais práticas.

Segundo Luciana, toda e qualquer manifestação que pregue superioridade, inferioridade, discriminação, ódio ou exclusão entre pessoas repercute diretamente no Direito, uma vez que a lei determina que todos somos iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. “A partir do momento que este tipo de manifestação atinge uma ou mais pessoas, causando-lhe um mal injusto, aquele que deu causa responderá pelo seu ato na medida de sua culpabilidade, seja na esfera cível e/ou criminal”, explica.

A advogada ressalta que, “assim como a misoginia, pedofilia, etarismo, dentre outros, o termo machosfera não é encontrado na legislação brasileira, mas referidas práticas podem ser enquadradas em tipos penais como assédio, injuria, injuria racial, difamação, ameaça, estupro e até racismo.”

Luciana ainda enfatiza a importância do combate à cultura da machosfera, misoginia, estupro e etarismo no contexto jurídico. Ela destacou a criação do Protocolo de Julgamento com perspectiva de gênero pelo Conselho Nacional de Justiça em 2021, que visa garantir o direito à igualdade e à não discriminação de todas as pessoas nos julgamentos. Segundo ela, esse documento representa um avanço na direção de romper com culturas de discriminação e preconceitos em todas as áreas do direito, não apenas na violência doméstica.

A advogada também afirmou que a influência do patriarcado, do machismo, do sexismo, do racismo e da homofobia é transversal e produz efeitos na interpretação e aplicação do direito em todas as áreas, como direito penal, direito do trabalho, tributário, cível, previdenciário entre outros.

Para ela, é preciso conscientizar os profissionais do direito sobre a importância da perspectiva de gênero e da igualdade para garantir uma justiça mais justa e igualitária para todos. Em suas palavras: “O Protocolo de Julgamento com perspectiva de gênero é um importante instrumento para garantir a igualdade e a não discriminação nos julgamentos e avançar no combate às culturas de discriminação e preconceitos. É fundamental conscientizar os profissionais do direito sobre a importância da perspectiva de gênero em todas as áreas do direito para garantir uma justiça mais justa e igualitária para todos”.

A advogada ainda falou sobre a importância da conscientização para combater práticas associadas à machosfera em espaços públicos, como discurso de ódio, assédio online e outras formas de discriminação baseadas em gênero. Para Luciana, além do posicionamento firme do judiciário, é imprescindível que todos os poderes públicos, instituições privadas, associações, mídias sociais e imprensa realizem campanhas permanentes de conscientização com abordagens jurídicas.

Essas campanhas têm o objetivo de alertar a sociedade sobre a importância de se combater a cultura da discriminação e do preconceito de gênero e, assim, construir uma sociedade mais justa e igualitária.

“Acredito que além do posicionamento firme do judiciário em desfavor destas práticas, é imprescindível para conseguirmos combater comportamentos ou práticas associadas à machosfera em espaços públicos, como discurso de ódio, assédio online ou outras formas de discriminação baseadas em gênero, a realização de campanhas permanentes de conscientização, com abordagens jurídicas, campanhas estas que devem ser realizadas por todos os poderes públicos, instituições privadas, associações, mídias sociais, imprensa”, finaliza  a advogada.

Confira dados da pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública sobre a violência contra as brasileiras em 2022:

●              46,7%       sofreram assédio sexual

●              28,9%       sofreram algum tipo de violência de gênero

●              11,6%       das mulheres entrevistadas foram vítimas de violência física

●              23,1%       sofreram ofensas verbais

●              13,5%       ameaças de violências físicas

●              9%            ofensas sexuais

●              5,4%         espancamento ou tentativa de estrangulamento

●              5,1 %        ameaça com faca ou arma de fogo

●              4,2%         lesão provocada por algum objeto que foi atirado nelas

●              1,6%         esfaqueamento ou tiro

●              12,8%       assediadas fisicamente no transporte público

●              41,0%       ouviram cantadas e comentários desrespeitosos na rua ou no ambiente de trabalho

Apesar de se tratar de um fenômeno online, a machosfera tem consequências reais na vida das pessoas, especialmente das mulheres e LGBTI+. Os ataques verbais e as ameaças que ocorrem nesse ambiente podem afetar profundamente a autoestima e a segurança desses grupos, além de contribuírem para a perpetuação da violência de gênero e da discriminação.

Caso saiba de algum tipo de violência contra a mulher, denuncie. Ligue 180.

Luciana Castro é advogada com atuação no Centro-Oeste de Minas. Foto: Jean Olivier/Reprodução

 

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