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Vice-presidente de Associação Ambientalista fala sobre danos ambientais

Para o vice-presidente da Associação Ambientalista dos Pescadores do Alto São Francisco (AAPA), Saulo de Castro, o atual período de estiagem que compromete o abastecimento de água em diversas cidades e afeta o nível dos rios, poderá ser apenas o início de uma mudança no ecossistema se não houver um aumento no volume das chuvas.

 

 

Na entrevista concedida ao Jornal Cidade, o ambientalista discorre sobre os danos ambientais provocados pela usina de açúcar em Lagoa da Prata e cobra uma ação mais enérgica dos órgãos ambientais do município com relação à defesa e revitalização dos mananciais que foram drenados indiscriminadamente. “Faltam lideranças proativas. O município deve ter mais atitude e coragem”, avalia Castro.

 

 Jornal Cidade: Estamos vivendo talvez a pior estiagem dos últimos anos e o rio São Francisco tem sofrido os impactos. A AAPA vem criticando há muito tempo a degradação do rio. Como você avalia a postura dos órgãos governamentais nessa questão?

Saulo de Castro: O que temos observado nesses anos é que tem ocorrido uma omissão por parte destes órgãos governamentais com relação ao rio São Francisco. O Ministério Público e o Poder Judiciário têm sido bastante atuantes dentro de nas suas limitações, têm buscado as soluções de maneira inteligente, buscando resolver as questões de forma consensual.

 

[pull_quote_right]De 2013 para 2014 o volume de chuva diminuiu e muito, e se continuar assim, só agravará a nossa situação.[/pull_quote_right]

 

Jornal Cidade: Em um comentário nas redes sociais você disse que o pior ainda estaria por vir em relação ao rio São Francisco. Por que esta visão tão pessimista?

Saulo de Castro: Na verdade esta é uma visão baseada em estudos de cientistas. Estamos vendo a diminuição gradativa do volume de chuvas.  É visível que desde o verão passado as chuvas diminuíram muito. E imaginando um cenário que neste verão tenhamos o mesmo volume de chuva do ano passado, nós teremos sérios problemas para o próximo ano. Em 2011 e 2012 tiveram boas chuvas que encheram os rios, e em 2013 não tivemos os problemas que estamos tendo hoje. De 2013 para 2014 o volume de chuva diminuiu e muito, e se continuar assim, só agravará a nossa situação.

 

Jornal Cidade: A Associação tem se posicionado de uma maneira muito crítica em relação à retirada de água que a usina açucareira retira do rio São Francisco. Se por um lado a empresa precisa dessa água para a manutenção dos seus trabalhos, por outro lado provoca um dano muito grande ao rio. A empresa possui todas as autorizações para a retirada de água do São Francisco. Para você e os demais ambientalistas que defendem o rio, qual é o sentimento?

Saulo de Castro: O sentimento é de frustração, porque a gente observa que as autorizações são concedidas pelos órgãos sem que eles façam uma averiguação da situação do rio, se ele tem ou condições de fornecer esta água. E por outro lado, temos também o lado da empresa, que mesmo com a licença, deveria avaliar até que ponto ela pode se valer desta autorização e retirar essa água de forma indiscriminada, já que o rio está numa situação calamitosa. Sabemos que a empresa precisa da água para manter sua operação, mas deveria também promover a revitalização deste rio que fornece este combustível para ela operar. O passado da empresa é muito triste e vergonhoso, porque ela se valeu da destruição do meio ambiente para chegar aonde chegou.

 

Jornal Cidade: Em Lagoa da Prata o índice de chuvas é o mesmo das demais cidades da região, porém, muitas pessoas têm a sensação de que chove menos no município. Você acha que isso pode ter algum vínculo com a monocultura da cana?

Saulo de Castro: Com toda a certeza. A cana não é algo que beneficia a formação de chuva como uma árvore qualquer. Quando vem chuva aqui elas são fortes e caem tudo de uma vez, dissipando e desaparecendo. Estamos caminhando para um clima da região norte de Minas, e isso é muito ruim, a situação lá é como no nordeste do Brasil. E se Lagoa da Prata não preservar as matas, os rios e continuar com o avanço da monocultura da cana, eucalipto e a criação de gado de corte, a previsão é que o clima ficará pior.

 

Jornal Cidade: Lagoa da Prata se desenvolveu em uma região pantanosa, com inúmeras lagoas, e grande parte delas foram drenadas. A AAPA tem algum estudo do prejuízo ambiental causado a esses mananciais?

Saulo de Castro: Nós fizemos um levantamento, um estudo de oito dias com duas profissionais do IBAMA em 2012, e identificamos 38 lagoas marginais que foram drenadas para que se fizesse o plantio da cana. Mas, tenho a certeza que se fizéssemos outra varredura encontraríamos muito mais. Segundo informações de pescadores antigos, Lagoa da Prata tinha mais de 80 lagoas, sem contar as nascentes que aqui existiam. Onde hoje é o perímetro urbano de Lagoa da Prata, havia três ou quatro lagoas. Hoje temos somente uma. É uma região rica que precisa ser cuidada.

 

Jornal Cidade: Você acha que é possível revitalizar essas lagoas?

Saulo de Castro: Com toda a certeza. São intervenções simples, pois elas têm nascentes naturais que manterão essas lagoas.

 

Jornal Cidade: O fato de a maior parte dessas lagoas estarem em propriedades particulares, é um entrave para a revitalização?

Saulo de Castro: Este é o maior entrave. Essas lagoas estão praticamente na mão de somente um latifundiário, e este não concorda com essas revitalizações. A empresa EPOMTA é detentora da maioria das terras do entorno de Lagoa da Prata. Esta recuperação não trará o prejuízo que eles (os donos da empresa) pensam que irá trazer. Na verdade, poderá trazer mais recursos e benefícios, terão mais turistas, poderão usar a água e ainda poderão entrar em programas do governo, que beneficiam empresas que preservam nascentes. A visão dessas pessoas é muito arcaica que está arraigada no passado.

 

[pull_quote_left]Todas as administrações de Lagoa da Prata nunca levantaram a bandeira em defesa do meio ambiente nestas questões. Faltam lideranças proativas. [/pull_quote_left]

 

Jornal Cidade: O trabalho da Secretaria de Meio Ambiente de Lagoa da Prata nos últimos anos, na defesa dessas causas, poderia ter sido melhor?

Saulo de Castro: Todas as administrações de Lagoa da Prata nunca levantaram a bandeira em defesa do meio ambiente nestas questões. Faltam lideranças proativas. Eles têm todo o poder nas mãos para resolver de forma consensual ou por decreto. O município deve ter mais atitude e coragem. Essas pessoas precisam parar de olhar para os próprios interesses e olhar para o interesse de toda a comunidade.

 

Jornal Cidade: Em relação às queimadas nos canaviais, você acredita mesmo que elas sejam criminosas?

Saulo de Castro: Em uma plantação de arroz, milho ou soja, por exemplo, não se tem problemas com queimadas. Infelizmente enquanto houver essa monocultura a população terá que se acostumar com isso.

 

Jornal Cidade: Obrigado pela entrevista. Gostaria de fazer mais alguma consideração?

Saulo de Castro: Iniciamos um trabalho de coleta de assinatura para a revitalização do Brejão e já estamos com 1700 assinaturas. Se não fizermos essa revitalização, teremos a falta de água em breve. O município tem aberto mão de um reservatório que tem a capacidade de 30% do reservatório da Cantareira, que é um dos que abastecem a cidade de São Paulo. Lagoa da Prata tem cerca de 50 mil habitantes, enquanto em São Paulo são milhões de pessoas. Essa é uma reserva estratégica. O SAAE retira água de poços profundos, que é mais fácil e conveniente, enquanto poderíamos ter essas águas de superfície e deixar reservadas as águas subterrâneas.

 

 

 

 

 

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