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Uma Lágrima

Segundo a mãe ele foi uma criança normal. Nasceu tal como os outros filhos, em casa mesmo, com a ajuda de parteiras, comumente utilizadas em Lagoa da Prata há alguns anos atrás.

Todos diziam que o menino tinha “amor” pela “pinga” desde a infância, pois, assim como o pai, logo de manhã tomava uma “fininha” para “acabar de acordar”. Nunca foi de beber de forma demasiada. Mas nunca saía de casa para beber pouco. Entornava o caldo mesmo.

O pai faleceu e ele aprumou de vez para o lado da “margaça” e passou a beber todos os dias, cedo, meio-dia e a noite. E logo, logo, apareceram os problemas de saúde, vez que o álcool causa danos a todo o corpo, principalmente ao sistema nervoso, coração, fígado e pâncreas, como todos já sabem.

Com pouco mais de 30 anos, passou então a viver apenas para a cachaça. Passava a maior parte do dia bêbado. Não poucas vezes dormiu na rua, na calçada, na porta de casa, na rodoviária, e no cemitério. A polícia o alcançou talvez duas, talvez três vezes por atos obscenos. O homem estava realmente degradando a sua saúde a cada dia. E não parava de beber.

Novenas, rezas, velas, missas, orações, e muitos outros tipos de esperanças foram rogadas a todos os santos conhecidos. E o pobre coitado, sempre bêbado. Um amor do passado? Relacionamentos desfeitos? Frustração da vida, tristeza, melancolia? Ninguém sabia ao certo o porquê de tanta amargura.

O rapaz chegava em casa, chorava, mas nunca chegou próximo a ninguém para pedir qualquer tipo de ajuda. Não se abria nem mesmo para a própria mãe sobre o porquê de tanto trabalho, de tanta tristeza.

Passou mal em casa por várias vezes, passou mal também no trabalho e, levado para a perícia e INSS, o médico afirmou aposentá-lo, antes que algo de mais grave o alcançasse ou que ele viesse, no auge dos seus delírios, passar a mão em um galho de árvore ou outra coisa, e pudesse acertar alguém, machucar pessoas. A saúde então, de tanto ser maltratada, sucumbiu.

O homem foi encontrado caído na calçada de sua casa e foi colhido por uma ambulância e levado até o Pronto Socorro. Recebeu os primeiros cuidados e ante a gravidade do seu estado, foi levado até o Hospital São João de Deus, em Divinópolis e ali, internado. E veio uma notícia horrível. Entrou em coma.

Os parentes, os amigos, funcionários do hospital, todos, tentaram em vão, produzir nele algum tipo de reação, mas não conseguiram. No dia das mães, a mãe foi até o hospital e ali se instalou. Disse ela que não sairia dali enquanto o seu filho não lhe desse algum sinal de melhora. Passou todo o dia conversando com ele, contando-lhe histórias, novidades, causos da roça onde ele trabalhava e residia.

Num certo momento a mãe lembrou-se de histórias do pai do jovem e passou a falar sobre elas. Qual não foi a surpresa das enfermeiras e de uma funcionária do hospital ao ver uma lágrima escorrendo de um dos olhos do rapaz, imóvel, sobre a cama.

A mãe do rapaz deu pulos de alegria, e partiu para casa. Disse a todos que poderiam esperar que breve, breve, o filho iria para casa. E realmente foi o que aconteceu.

Logo foi para casa, alegre, sorridente e perfeito, sem nenhum tipo de trauma ou sequela.

E segundo os parentes, nunca mais bebeu.

Histórias que o povo conta…

IJR/

Isaías Ribeiro é policial militar, instrutor do Proerd, músico e escritor
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