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No tronco | Artigo

Muito tempo antes das navegações exploradoras do Novo Mundo, os colonizadores já eram especialistas na arte de propagandas enganosas para os súditos, o povo, a base da pirâmide. Suas promessas iludiam aqueles que nasciam sem a riqueza dos palácios. Na contemporaneidade, suas estratégias políticas listadas nos compromissos eleitorais manipulam o momento do voto, pois a escolha do eleitor é direcionada para manter os mesmos coronéis no poder desde os anos 1500, se falarmos apenas das terras tupiniquins. O trono não muda de dinastia, só os sobrenomes são alterados para que os filhos, os netos, as outras gerações perpetuem no comando da nação.

Engana-se quem acredita na bondade da Vossa Alteza, a Princesa Isabel, que aboliu a escravatura com uma “canetada”. A decisão da soberana foi importante àquela época para libertar os negros do chicote dos capatazes. Contudo, o açoite não foi alterado. A covardia e o domínio dos sujeitos mais fortes são perpétuos. A escravidão, substantivo da dor, ganhou nome pomposo, da língua morta, do latim, da época em que os soldados romanos recebiam o pagamento em forma de sal. Atualmente, os homens são escravos do salário, de preferência, do mínimo. Nada mudou desde a Lei Áurea. Afinal, outras leis foram aprovadas para que os operários tenham a ração básica para a sobrevivência. Uma máscara para a servidão eterna.

Na senzala, comia-se milho ou mandioca, o que sobrava da Casa Grande, como as frutas, os grãos, a carne desprezada e transformada em feijoada. Prato para dar sustança. Na casa humilde, é a cesta básica que enche o estômago e dá saciedade. Naquele pacote abarrotado de embalagens não há alimentos extravagantes. Eles nem são necessários, pois alguém determinou que ali há o suficiente para se aguentar o “batido da lata”. É a ração do mês. Para os colonizadores, vão as melhores hortaliças, frutas, verduras. O mais fino e nobre café. O minério das Gerais, do Pará, de todos os cantos onde há palmeiras imperiais. Nada permanece na Colônia do Pau Brasil. Ou no sacolão do seu bairro chegam os melhores produtos da fazenda? A cebola e o tomate estão mais caros do que ouro, mas não valem nem o preço da parafina.

Os senhores fornecem dois alimentos para os escravos: o alimento material, para a sobrevivência do corpo, do braço para o trabalho, e o alimento espiritual, que mantém a alma em consonância com o desejo de Deus. Ou seja, o desejo da paz, da humildade, da obediência. Os líderes no Congresso decidem até qual religião deve ser respeitada e seguida. E quem não obedece é um pecador, um criminoso, um sujeito à margem. Marginalizado. Iludido pela propaganda de que onde se vive é o paraíso, como o pescador que vislumbra o azul do mar todos os dias quando enfrenta as águas da labuta. De sua janela de barro, recebe a brisa e o cheiro dos coqueiros ao vento. O sol é encantador. Mora na terra prometida, mas não usufrui dali na mesma medida do seu trabalho. Seu pescado é riqueza apenas para os chefs renomados internacionalmente. Pobre nativo. Não vai sair do paraíso nunca para garantir a vida boa do ar-condicionado. A promessa é bíblica e o pé calejado anda de chinelos amarrados com arame. Quanta ostentação paradisíaca, não é mesmo?

Um escravo era considerado adulto a partir dos 12 anos de idade. Trabalhava das 6 às 22 horas, sem descanso. Aos 35, já tinha cabelo branco e boca desdentada. Antes de morrer fatigado, ainda servia para algo até os 45 ou 50. Logo, “aposentava-se” com 38 anos de servidão. Os tempos são novos. A expectativa de vida do brasileiro passou para os 75.  Se a Lei da Previdência for aprovada, trabalha-se até os 65, se a carteira for assinada aos 16, pois pela nova regra é preciso contribuir 49 anos para receber a aposentadora integral. Sobram 10 anos para curtir o benefício. Notou alguma semelhança com a época do Império Brasileiro? Use a matemática para entender. Depois de recorrer à calculadora, lembre-se que as condições horríveis dos navios negreiros ainda persistem nos ônibus lotados que saem da periferia para levar os operários ao trabalho. Vive-se uma ilusão desde o dia 13 de maio de 1888.


Juliano Azevedo

Jornalista, Professor Universitário, Escritor.

Blog: www.julianoazevedo.blogspot.com.br

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