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Eles não podem mudar o passado, mas buscam um novo futuro

O método Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) foi criado em 1974 por Mário Ottoboni, que é advogado, mas que deixou a profissão de lado para dar assistência a presos e aos pobres, principalmente da população prisional. Fundada há oito anos, a Apac de Lagoa da Prata possui 152 recuperandos. “O método realmente funciona. O trabalho da Apac dispõe de um método de valorização humana vinculada à evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar-se”, afirmaram o presidente Francisco José de Miranda e o diretor adjunto Carlos Roberto Aparecido Ramos.

Diretor adjunto Carlos Roberto Aparecido Ramos.
Diretor adjunto Carlos Roberto
Aparecido Ramos.
Mário Ottoboni e o presidente da Apac Francisco José de Miranda
Mário Ottoboni e o presidente da Apac Francisco José de Miranda

Segundo o recuperando Flávio Rodrigues de Oliveira, de 30 anos, que está na Apac desde agosto de 2011, o método deu a ele ferramentas para a sua reeducação. Atualmente ele faz um curso superior à distância de Administração. A disciplina aqui é fundamental. Fazemos um exame toxicológico para atestar que ninguém faz uso de drogas aqui dentro. A pessoa que não demonstra uma vontade de mudar de vida não permanece na Apac. Meu maior projeto ao sair daqui é montar um negócio na área de bicicleta com o meu irmão”, afirmou.

Flávio Rodrigues de Oliveira, 30 anos, na Apac desde agosto de 2011.
Flávio Rodrigues de Oliveira, 30 anos, na
Apac desde agosto de 2011.

A principal diferença entre a Apac e o sistema carcerário comum é que, na Apac, os presos (chamados de recuperandos) são corresponsáveis pela recuperação deles, além de receberem assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica prestadas pela comunidade. A segurança e a disciplina são feitas com a colaboração dos recuperandos, tendo como suporte funcionários, voluntários e diretores das entidades, sem a presença de policiais e agentes penitenciários.

Com o objetivo de oferecer cursos profissionalizantes para os recuperandos, a Apac investe em parcerias. “Hoje oferecemos para eles cursos de padeiro, laborterapias, montagem de bicicletas e rodas, e outros cursos que o Senai manda como panificação, confeitaria e logo mais, fecharemos, se tudo der certo, um curso intensivo de mecânica, em parceria com a Fiat. Além disso, oferecemos ensino escolar desde alfabetização até graduação, como é o caso de três recuperandos que hoje fazem faculdade à distância”, destacaram Beto e Quito.

A reportagem do Jornal Cidade visitou a Apac de Lagoa da Prata e, acompanhada pelo presidente Francisco José de Miranda, pelo diretor adjunto Carlos Roberto Ramos e pelo encarregado de segurança Anderson Rodrigues conheceu o local.

MONTAGEM DE BICICLETAS

A fabricante de bicicletas Braciclo transferiu praticamente todas as suas operações de montagem para a Apac de Lagoa da Prata. Nessa espécie de filial, os quadros soldados e pintados vão ganhando partes e componentes pelas mãos de condenados, que entregam cerca de 3 mil bicicletas por mês. Atualmente, os recuperandos são responsáveis pela montagem de 70% das unidades completas e de 90% das rodas da indústria. O gerente de produção da Braciclo, André de Souza Machado, diz que a dedicação e a competência demonstradas pelos recuperandos no começo da parceria, quando havia apenas a montagem de rodas, encorajaram a empresa a aumentar a participação da linha de trabalho instalada na Apac. “Posso dizer que me surpreendi muito com o trabalho prestado, tanto em quantidade como principalmente na qualidade. Na empresa trabalha um recuperando que, devido ao bom trabalho prestado enquanto esteve privado de liberdade, recebeu a oportunidade da empresa. Já são 5 meses de trabalho prestado e até o momento tem sido muito positivo”, explica André.

Recuperandos participam da montagem de 3 mil bicicletas por mês.
Recuperandos participam da montagem de 3 mil bicicletas por mês.

A aposta da empresa foi favorecida por uma circunstância inesperada. Um ex-funcionário, Flávio Rodrigues de Oliveira, foi condenado à prisão e admitido na Apac para cumprir pena. Pelos bons serviços prestados à Braciclo quando estava em liberdade, recebeu a missão de liderar os demais recuperandos na linha de montagem. Flávio diz que assumiu a tarefa com senso de responsabilidade maior do que quando era uma pessoa livre. Ele observa que, para um ex-preso, é muito mais difícil conseguir vaga no mercado de trabalho. “Além de ficar atento às metas, ensino todo o serviço. Tenho que corresponder à confiança, mas tem sido tranquilo porque o pessoal aqui aprende rapidinho”, conta.

PARCERIA COM BIOSEV

Parceiros desde 2009, a Biosev doou em dezembro de 2014 os equipamentos da padaria da APAC. No espaço, os recuperandos têm a oportunidade de aprender uma nova profissão, o que contribui para a reinserção no mercado de trabalho e na sociedade. A empresa doou batedeira industrial, cilindro para massa, compressor de ar, divisora de massa, embaladeira de leite, forno elétrico industrial, freezer horizontal e pasteurizador.

Com isso, os pães produzidos na padaria da APAC são vendidos para empresas, como a própria Biosev, e para órgãos públicos, como a Prefeitura de Lagoa da Prata. Toda a renda é destinada aos trabalhos de recuperação da associação. “Neste ano, a Biosev comemora 15 anos de presença em Lagoa da Prata, e o apoio à atividade realizada pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) é uma das iniciativas que reforçam a ligação da empresa com a comunidade local. Para a empresa, a entidade proporciona uma importante oportunidade de ressocialização para os detentos, por meio de uma série de atividades, como a produção de pães, feitos a partir de equipamento doados pela usina”, destacou a nota enviada pela empresa ao Jornal Cidade.

Pães produzidos na Apac são vendidos para a Prefeitura, Biosev e outras empresas da cidade. Na foto o recuperando André Bergamasco
Pães produzidos na Apac são vendidos para a Prefeitura, Biosev e outras empresas
da cidade. Na foto o recuperando André Bergamasco

A padaria da Apac produz pão de sal, pão de doce, pão para cachorro quente e salgados. As encomendas podem ser feitas pelo telefone 3261-6787.

PARCERIA COM A PREFEITURA

Em parceria com o setor de habitação da Prefeitura Municipal de Lagoa da Prata, os recuperandos atuam como pedreiros, bombeiros hidráulicos, carpinteiros e pintores em construções e reformas de casas para pessoas carentes. A coordenadora do projeto, Emília Mesquita, diz que o emprego dos recuperandos é visto de forma muito positiva pela população de Lagoa da Prata. Ela acrescenta que a Prefeitura também está satisfeita, uma vez que a qualidade da mão de obra é inquestionável. “Esses jovens participam, juntos com técnicos e engenheiros, das decisões sobre o que deve ser feito nas residências selecionadas”, observa Emília.

Recuperandos trabalham na reforma e construção de casas para famílias carentes.
Recuperandos trabalham na reforma e construção de casas para famílias carentes.

No mês de junho, dois recuperandos ajudaram na organização da biblioteca pública Coronel José Vital. Segundo a bibliotecária Fátima César, foi uma excelente experiência. “Eles são muito respeitadores, educados, trabalharam mesmo e demonstraram uma grande vontade de mudar de vida. Foi uma experiência muito válida e incrível, tanto para nós quanto para eles. Eles sentem que as pessoas vão ter medo no primeiro contato e as pessoas precisam dar uma chance”.

A organização e mudança da biblioteca pública contou com o apoio de recuperandos
A organização e mudança da biblioteca pública contou
com o apoio de recuperandos

PARCERIA COM EMBARÉ

Nos processos produtivos da Embaré são gerados diariamente vários tipos de resíduos recicláveis como plásticos, papéis, paletes de madeira, entre outros. A Embaré, que tem seu Sistema de Gestão Ambiental certificado na ABNT NBR ISO 14001, destina esses resíduos para várias entidades de Lagoa da Prata, com o objetivo de reciclar. Esse trabalho, além de tratar corretamente os resíduos, possibilita a geração de renda para essas entidades. “No caso da APAC, a parceria iniciou-se em março de 2014. Desde então, a empresa envia à entidade, semanalmente, paletes de madeira que, após reforma efetuada pelos recuperandos, são devolvidos à Embaré. Pelo trabalho, a empresa remunera a APAC com determinada importância por unidade de paletes reformados, através de nota fiscal de prestação de serviços. De março de 2014 até o mês de julho de 2016, a Embaré enviou para a Apac, uma média de 1.000 paletes por mês”, afirmou o gerente da Divisão Suprimentos Embaré, José Henrique da Silva.

Alisson Silva ajuda na recuperação dos paletes utilizados pela Embaré
Alisson Silva ajuda na recuperação dos paletes utilizados pela Embaré

Para a Embaré essa parceria é de extrema importância. “São vários os motivos, como qualidade do trabalho prestado, regularidade na retirada dos paletes na Embaré, menor tempo de retorno  dos paletes reformados à empresa e reaproveitamento do resíduo de paletes.  Acreditamos que a importância desse trabalho para a empresa e preservação do meio ambiente, possibilita aos recuperandos, mesmo reclusos, sentirem-se integrados  à sociedade”, frisou.

PARCERIA COM INDÚSTRIA DE BRINQUEDOS

“Temos a parceria há um ano e os recuperandos produzem 3 mil andadores por mês. Para nós, é muito gratificante contar com o apoio da HCM Indústria de Brinquedo e esperamos que cada vez mais as empresas possam vir conhecer o trabalho que é feito aqui e entender que as pessoas merecem chances”, afirmou o diretor da Apac.

Na Apac também são montados 3 mil andadores infantis todos os meses
Na Apac também são montados 3 mil andadores infantis
todos os meses

COM A PALAVRA, OS RECUPERANDOS

40“Eu desperdicei a minha vida, larguei tudo para me envolver com o crime e hoje a Apac vem me devolvendo a chance de cuidar da minha filha, trabalhar, estudar e estar com a minha família. Inclusive, estou fazendo faculdade de administração. Quando eu cheguei aqui não tinha intenção nenhuma de mudar de vida, só queria cumprir a pena mais rápido e sair para cometer crime. Meu objetivo é ter uma vida feliz sem fazer nada de errado” – Felipe Morais Rodrigues, 27 anos, na Apac desde janeiro de 2011.

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“Estou na Apac há mais de 2 anos e de lá pra cá eu mudei muito a visão das coisas. Apesar de ter cometido um crime, eu só pensava em trabalhar e não tinha tempo para ficar com minha família. Isso eu quero fazer um pouco diferente quando sair. Cheguei aqui somente com a quarta série e hoje já estou na nona e pretendo continuar. Temos também um belo trabalho de evangelização, e isso faz muita diferença” – Jimar Calixto Pedro, 45 anos, na Apac desde novembro de 2014.

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“A Apac mudou tudo na minha vida, inclusive o meu jeito de pensar. Antes eu pensava em ganhar dinheiro fácil, mas quando fui preso vi a realidade da coisa. Na cadeia a gente sofre demais e quando vamos para a Apac temos uma proposta de vida. Eles nos mostram o caminho certo e trabalham a nossa essência. Eu nunca tinha trabalhado antes de vir para a Apac e vi que isso é importante para o ser humano. No ano que vem eu me formo e também, se Deus quiser, vou fazer uma faculdade” – Márcio Júnior Cleidio do Amaral, 22 anos,  na Apac desde junho de 2015.

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“A Apac tem um sistema totalmente inverso ao que é aplicado em um sistema prisional comum. Aqui eu tenho total dignidade e respeito para cumprir a minha pena. Além disso, aqui não tenho que passar por nenhum constrangimento e nem a minha visita passa por humilhação. No sistema comum eu seria chamado pelo número, e aqui sou chamado pelo meu nome. Aqui eu resgatei os meus valores morais e éticos para ter total acesso à sociedade novamente. Queremos quebrar o preconceito das pessoas e mostrar que o sistema funciona”  – Thiago Cunha Brito, 37 anos,  na Apac desde novembro de 2015.

 

 

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