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Artigo: Até onde deve ir a proteção dos pais?

A dependência emocional dos filhos pode aparecer não apenas por meio de comportamentos infantilizados, como a dificuldade de suportar as frustrações ou de controlar os impulsos, mas pelo desenvolvimento de um transtorno de ansiedade ou de depressão ou, o que é muito comum, pelo uso abusivo de álcool ou outras drogas.

Rodrigo Tavares Mendonça

O título inicial deste artigo era “Até onde deve ir a proteção materna?”, porque é mais comum as mães superprotegerem os filhos. Mas seria injusto, os pais também superprotegem os filhos, embora com menos frequência. Além disso, frequentemente a superproteção materna aparece como uma consequência parcial da ausência paterna. De toda forma, o problema é o mesmo: a superproteção. Até onde deve ir a proteção dos pais?

Os bebês nascem completamente dependentes da proteção paterna, incluindo no adjetivo a mãe ou uma pessoa diferente que exerça essa função. Por consequência da maturação do organismo e da aprendizagem por imitação, o bebê cresce e se torna um pouco mais independente, conseguindo, por exemplo, comer sozinho uma comida que se apresenta diante dele. A criança maior aprende também por consequência da maturação do organismo e da aprendizagem por imitação, mas adquire uma habilidade nova: a reflexão. Essa habilidade se desenvolve até a fase adulta e se torna responsável por conferir a capacidade para o adolescente passar para a próxima fase na vida.

Acontece que a capacidade reflexiva do ser humano é influenciada pelos estímulos do ambiente, pelas mudanças emocionais e pelo próprio desenvolvimento orgânico. Assim, fatores internos e externos podem afetar a capacidade reflexiva de uma pessoa. Além disso, a reflexão é apenas um elemento importante para a construção da nossa vida, a vivência é fundamental para acreditarmos do que somos capazes. Não basta, por exemplo, você refletir sobre a sua capacidade de lavar uma louça ou uma casa, é preciso realizar a tarefa com frequência para aprender que isso não é um bicho de sete cabeças. Apesar de não impedir a reflexão, a superproteção impede a vivência, limitando assim a aprendizagem empírica e, por consequência, a crença na sua capacidade de fazer.

Adultos superprotegidos aprendem que são incapazes de viver, de enfrentar os desafios da vida, de suportar tanto as frustrações ordinárias quanto as extraordinárias. Acontece que mesmo os adultos precisam de proteção. Por definição, os adultos são responsáveis por si mesmos, mas ainda assim não são totalmente independentes. E isso é assim porque nenhum ser humano é totalmente independente. Somos seres relacionais, precisamos do cuidado e da proteção das nossas relações para viver. Por esse ponto de vista, a pergunta anterior se faz importante: até onde deve ir a proteção dos pais?

Uma resposta simples seria: os pais devem fazer para os filhos apenas o que eles não conseguem fazer por eles mesmos. A vida, no entanto, costuma ser mais complexa, elementos diferentes aparecem como fatores importantes. A necessidade de descanso, por exemplo, pode aparecer como um desses elementos que justifica uma ajuda externa. Essa máxima, contudo, pode ser um norte orientador. Fazer pelo outro o que o outro consegue fazer por ele mesmo pode limitar a sua vivência, o desenvolvimento de um senso de capacidade, pode acabar fortalecendo o sentimento da preguiça e diminuindo a autoestima. Enfim, estimula a dependência. Assim, a chegada na fase adulta pode ser retardada, produzindo assim pessoas maiores de idade pela lei mas que ainda não saíram da adolescência.

A dependência emocional que se produz entre pais e filhos costuma ser uma via de mão dupla. É mais fácil perceber um adulto infantilizado do que um pai ou uma mãe que construiu a sua vida em volta da do filho, perdendo assim a capacidade de ter uma vida independente. Quando isso acontece, a dependência dos pais fortalece a dependência dos filhos, que acabam não podendo se tornar independentes sem produzir um sofrimento intenso nos pais, muitas vezes acompanhado de um vazio de sentido, como se sem a dependência dos filhos a vida dos pais perdesse o sentido.

A dependência emocional dos filhos pode aparecer não apenas por meio de comportamentos infantilizados, como a dificuldade de suportar as frustrações ou de controlar os impulsos, mas pelo desenvolvimento de um transtorno de ansiedade ou de depressão ou, o que é muito comum, pelo uso abusivo de álcool ou outras drogas. Quando isso acontece, mesmo sem a intenção, a dependência emocional dos pais acaba fortalecendo a dependência dos filhos, o que dificulta a sua melhora de um transtorno mental ou o abandono de uma dependência química.

Pais e filhos precisam compreender o limite da dependência. Não existe uma linha clara que a separa, mas um olhar cuidadoso pode possibilitar uma vida mais independente e saudável para todos. A independência total não é possível, e muito menos desejável. Precisamos uns dos outros. O amor pressupõe a dependência. Amar é estar vulnerável ao nosso objeto de amor. E isso não é negativo, pelo contrário, é belo. Aceitar a dependência emocional é tão necessário quanto desenvolver a independência.

(Foto: Arquivo pessoal/reprodução)

Rodrigo Tavares Mendonça é psicólogo e especialista em psicoterapia de família e casal. Contato: (37) 9.9924-2528

 

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