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Intervenção policial em evento cultural de Lagoa da Prata causa indignação de participantes

Durante abordagem, sargento Hamilton afirmou que iria solicitar ao poder público não autorizar mais eventos do coletivo; nas redes sociais participantes manifestaram repúdio.

Alan Russel

No último domingo (19) a Praça Capitão José Bahia foi palco de um evento cultural que atraiu centenas de pessoas para os arredores da Praia Municipal. Com o intuito de ocupar os espaços públicos da cidade, o Coletivo Nexalgum uniu forças e produziu a primeira edição do Imergir – Artes Integradas.  Quem marcou presença no evento pôde conferir apresentações de diversas bandas e artistas da cena local, exposições, intervenções artísticas e espaço para consumo circular com brechós e artesanatos.

O evento começou por volta das 15h e, antes de anoitecer, a praça já estava tomada de pessoas de todas as idades. Os atletas se faziam presentes na pista de skate e na quadra de basquete streetball. O gramado da Estação Ferroviária virou playground para as crianças e espaço de rodas de conversas para quem preferisse ficar mais distante do palco. O pôr-do-sol refletido nas águas da lagoa deu ares ainda mais charmosos ao ambiente plural do Imergir. Porém, ao cair da noite, a Policia Militar interveio de forma a tentar por fim no evento.

Em vídeo gravado durante a discussão, o sargento Hamilton Silva, um dos representantes que interviram no evento, afirma que “Ninguém é obrigado a ficar ouvindo merda dos outros não, eu inclusive vou à Prefeitura falar para não liberarem mais alvará para o seu evento, tá? Avisa lá”.

 

Entretanto, público e organizadores foram resistentes à intervenção policial e, após muito diálogo, o evento prosseguiu.

Pelo que foi apurado, a indisposição da polícia surgiu durante a apresentação do grupo de rap Keskara. Jhonatan, um dos mc’s do grupo, alertou o público quanto ao teor político de uma das músicas do repertório: “A próxima música não é indicada para fãs do presidente Jair Bolsonaro”, soltou o mc. O público, em grande maioria, começou a ecoar gritos contra o presidente. Mesmo cientes que manifestações de cunho político são recorrentes em todos os festivais de música no país, a Polícia Militar, achou pertinente intervir no andamento do evento após os gritos contra o presidente.

 

Algumas pessoas que estavam presentes ao evento usaram as redes sociais para expor o acontecido e condenar o posicionamento da Polícia Militar. O professor Gabriel Lopes, de 22 anos, alega que não havia necessidade da polícia intervir em um evento tão bem organizado e que não apresentava qualquer risco ao público.

Gabriel considera que a atuação policial tem cunho político. “Onde está escrito na constituição que eu não posso me expressar num evento público, em espaço público? Que direito é esse que o Estado tem de intervir no meu posicionamento e no meu entretenimento? Eu considero o posicionamento da polícia extremamente invasivo, autoritário e conservador”, finalizou Gabriel.

Participantes vão as redes sociais para manifestar indignação. (Redes Sociais/Reprodução).

Leticia Passos é outra jovem que usou as redes sociais para manifestar repúdio contra a atuação da Polícia Militar. A jovem de 21 anos que acompanhava as apresentações explica o que viu “Estava em uma roda de amigos quando a polícia chegou. Ficamos intrigados, pois acompanho os eventos do Coletivo Nexalgum desde o início, e nunca ouve briga ou algo que justifique a intervenção da polícia. Chegaram já acionando o giroflex, como se nós estivéssemos fazendo alguma coisa errada”, explicou Leticia.

“Os policiais alegaram que interviram quando começamos a gritar “Ei Bolsonaro vai tomar no c*”. Eles usaram a desculpa que era por causa do palavrão falado no microfone, porém, em nenhum momento foi dito no microfone. Foi o próprio público que estava gritando”, completou.

Leticia afirmou nas redes sociais que ato policial foi abuso de poder. (Foto: Redes Sociais/Reprodução).

Polícia Militar

A reportagem do Jornal Cidade entrou em contato com o Comando da Policia Militar em Lagoa da Prata para entender melhor o posicionamento da corporação sobre a ocorrência. Via contato telefônico, a PM informa que policiais que estavam em instrução no quartel, ouviram gritos e palavrões vindos do espaço onde acontecia o evento. Os policiais se deslocaram até o local e lavraram boletim de ocorrência. A PM também informa que ouviu uma testemunha que estava no evento. Acompanhada de uma criança de oito anos, a testemunha alega que se sentiu incomodada com a situação.

A reportagem também entrou em contato com a testemunha usada no boletim de ocorrências lavrado pela Polícia Militar. Jessica Rezende, que estava acompanhada da família durante o evento, afirma que foi procurada pela PM, que por sua vez informou que o evento era direcionado para adultos e não para crianças. Jessica alegou que em nenhum momento, nem ela, nem a família, sentiram-se incomodados com a postura do público do evento.

“De repente me chega um policial e me chama no canto, falando que precisava do meu nome, porque minha filha de 8 anos estava aqui e por esse motivo, precisava dos meus documentos, da minha documentação, do meu telefone, do meu nome completo e o nome da minha filha completo, porque era um evento para adultos e não para crianças, porém agora, eu ouvi boatos que ele tá falando que eu denunciei, de tal forma, não sei como, palavrões, coisas de baixo calão, hora nenhuma, em momento algum, eu fui até um policial, eu liguei para um policial, eu chamei um policial, mesmo porque eu estava dentro do evento, tava maravilhoso, minha filha amou, meu filho amou”, informou ela em áudio.

Ouça o áudio na íntegra:

 

Coletivo Nexalgum

O Coletivo Nexalgum é um grupo cultural sem fins lucrativos que desde 2011 vem realizando eventos com o intuito de promover a música local e criar espaços para músicos e bandas se apresentarem em Lagoa da Prata. De acordo com o coletivo, o Nexalgum conta hoje com doze voluntários que ajudam como podem, na área em que mais se identificam. Em contato com o Jornal Cidade, os integrantes do coletivo avaliam positivamente o resultado do Imergir.

“Foi um evento maravilhoso, onde conseguimos uma tarde e noite muito agradáveis, regado a muita música, exposições de trabalhos artísticos e artesanais, dança e brechós. Criamos um ambiente saudável, com muita troca de experiências no entorno da Praça Capitão José Bahia”.

Com relação à abordagem policial o Coletivo Nexalgum avalia que foi desnecessária a forma como a PM abordou alguns dos organizadores. “A polícia usando de tom elevado na voz, ameaças e poucas explicações quanto ao ocorrido, tendo em vista que foi compreendido o pedido da PM e brevemente atendido pela organização. Não compreendendo também, a ameaça quanto a proibição (frente à Prefeitura) de realização de eventos futuros naquele local público. No mais, pedido da PM atendido de forma imediata e pacífica pela organização, o evento seguiu com sua programação.

Evento contou com muita arte, música e exposição de produtores artesanais. (Foto: Gabriel Barbosa/Divulgação).

Próximas edições do Imergir – Artes Integradas

Os organizadores estão otimistas com a possibilidade de novas edições. “A resposta dos artistas, músicos e expositores que se apresentaram ali, foi super positiva, tanto quanto a do público presente, que já nos reportaram a ansiedade pela próxima edição. E é o que vislumbramos fazer em breve”, aponta o coletivo.

Com relação ao incidente com a Polícia Militar, o público espera que seja apenas um mal entendido, e que a polícia não seja um fator limitante das manifestações culturais e artísticas em Lagoa da Prata. Em tom bem humorado, a estudante Cecília Andrade até brinca com a situação. “A polícia veio fazer o seu papel. É um evento de artes integradas, teve música, dança, exposição… a polícia também veio apresentar seu teatro”, brincou a estudante.

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